EU SOU CAPAZ
Relatório Anual 2023
Contextualização
A população de Moçambique tem crescido desde o primeiro censo em 1980, passando de 12,1 milhões para 16,1 milhões em 1997, para 20,6 milhões em 2007, para 27,9 milhões em 2017. A taxa de crescimento anual médio intercensitário foi mais elevada em 2007-17 em 2,8%. O grande aumento da população neste período tem importantes implicações políticas para todos os sectores do governo, particularmente os da Educação, Saúde, Emprego e Habitação, que afetam o desenvolvimento econômico do país.
De acordo com o Inquérito Demográfico e de Saúde de 2011 (IDS, 2011), o país vem registando progressos substanciais em termos de protecção e desenvolvimento da criança nas últimas décadas. Entre 2004 e 2011, o número de alunos matriculados no EP1 aumentou cerca de 45%, e no EP2, cerca de 73%. A percentagem de alunos com seis anos de idade na 1ª classe passou de 36% para 72%, e a taxa bruta de conclusão primária de 18% para 47%. A percentagem de crianças menores de cinco anos cujo nascimento foi registado subiu de 31% em 2008 para 49% em 2011. Estes progressos são reflexo de um esforço conjugado de diferentes actores traduzidos em investimentos em termos de alocação de mais recursos para a construção de salas de aulas, mobilização comunitária para matrículas, formação de professores entre outras condições.
Os níveis de violência contra crianças são bastante graves e assumem as formas de agressões físicas, violação sexual, Violência Baseada no Género, usurpação de bens, negação de direitos entre outras. Mais grave ainda é o facto de esta violência que ocorre na família, na escola, nas instituições de atendimento, locais de trabalho e na comunidade onde era suposto serem dos locais mais seguros. O nosso país ocupa 7° lugar no conjunto dos países com elevados índices de Uniões Prematuras. O trabalho infantil continua a ser um problema grave, 35,6% das crianças maioritariamente no sector informal têm entre 7 e 9 anos de idade.
O Governo de Moçambique, através do Instituto Nacional da Juventude (INJ), instituição tutelada pela Secretaria do Estado da Juventude e Emprego (SEJE) está a implementar, com o suporte do Banco Mundial, o projeto de desenvolvimento designado: “Aproveitar o Dividendo Demográfico: Moçambique – Desenvolvimento e Empoderamento para Jovens” (PADD), cujo objectivo é, em resumo, melhorar o acesso à educação e às oportunidades de emprego para os jovens na faixa etária dos 10 aos 35 anos de idade, com especial enfoque para a Rapariga.
No âmbito da implementação deste projecto, foi estabelecido um Sistema de Resolução de Queixas (SRQ), que vai permitir aos adolescentes e jovens e outros actores interessados (com destaque para a rapariga), colocar as suas preocupações, mas sobretudo problemas que possam ocorrer, através de diversos meios, incluindo uma Linha Directa Gratuita. – “116” Sendo a Linha Fala Criança – uma instituição vocacionada e com vasta experiência na recepção e no atendimento, aconselhamento e encaminhamento de chamadas de denúncias de todos os casos de abuso, violência, tráfico e outras irregularidades que atentam contra o bem-estar das crianças, adolescentes e jovens, através do Numero de Emergência “116”, a SEJE viu sendo pertinente encetar contactos, tendo em vista assegurar para os grupos visados e interessados deste projecto, uma linha telefónica directa gratuita.
Objectivo
Estabelecer um Sistema de Resolução de Queixas (SRQ): Sistema de recolha, análise e resolução de queixas dos beneficiários do projecto ou outra pessoa com legitimidade, que permite aos implementadores do projecto acompanhar o grau de realização dos objectivos do projecto e corrigir os possíveis erros que possam ocorrer ao longo da sua implementação, monitoria e avaliação, através de uma linha directa (Número “116”).
Princípios Gerais do SRQ
- Acessibilidade; • Independência;
- Confidencialidade, privacidade e anonimato, • Transparência;
- Celeridade; • Respeito dos Direitos
- Humanos;
- Igualdade de género; • Justiça;
- Dupla apreciação da queixa.
Principais realizações:
(Assinatura de Memorando de Entendimento com a Secretaria do Esta do da Juventude e Emprego (SEJE)
Na sequência da execução dos programas “Eu Sou Capaz” e “Emprega”, que demandam a implementação de um Sistema de Resolução de Queixas permitindo que aos diferentes actores neles envolvidos, e em especial aos beneficiários (adolescentes e jovens), possam canalizar as suas reclamações e sugestões, foi celebrado um Memorando de Entendimento entre a LFC e a SEJE com objectivo de fortalecer os mecanismos de atendimento e assistência à criança, adolescentes e jovens no âmbito do Projecto de Aproveitamento do Dividendo Demográfico (PADD).
Implementação do Sistema de Resolução de Queixas Resposta ao “Eu Sou Capaz” e “Emprega”
O atendimento às chamadas telefónicas através do número gratuito “116” é a principal actividade no âmbito da implementação do Sistema de Resolução de Queixas – SRQ. As chamadas foram atendidas a partir dos (03) três centros de atendimento nomeadamente Centro de Maputo, Centro de Manica e Centro de Pemba, fornecendo aos utentes atendimento, aconselhamento e orientação sobre reclamações/ informação sobre os Programas “Eu Sou Capaz” e “Emprega”, do Projecto PADD. Para assegurar e garantir a realização das actividades e plena operacionalização do Sistema de Resolução de Queixas – SRQ, foi reforçada a capacidade operacional do Centro de chamadas da LFC através do incremento dos recursos humanos, com a contratação a tempo integral de (04) quatro conselheiros/a tendentes de chamadas, (01) um Assistente Financeiro e (01) uma Assistente de Monitoria e Avaliação. Foram igualmente contratados em regime parcial, (01) um Coordenador do Projecto, (01) um Analista de Dados, assim como assistência e segurança do escritório.
Gestão e Referência
Enquadram- se dois tipos de Referência e Gestão relativos a implementação dos Programas “Eu Sou Capaz” e “Emprega”, nomeadamente Referência e Gestão de Queixas e Reclamações e Gestão e Referência de Casos de abuso e violência contra criança. Os casos relativos aos Programas “Eu Sou Capaz” e “Emprega”, são na maioria solicitações de apoio ou reclamação que podem ter os seus desfechos ou soluções através dos Pontos Focais de cada programa e os Casos concernentes à abuso e violência contra crianças e adolescentes têm um tratamento diferenciado devido a sua natureza sensível, resultando em múltiplas referências para um único caso. Por exemplo um caso de violação, independentemente de a vítima ser uma beneficiária directa ou não do Projecto, o caso é referenciado as autoridades locais (dependendo do tipo de violência) – Polícia, Acção Social, Procuradoria Distrital, Centro de Saúde, com conhecimento do Ponto Focal de Salvaguardas Ambientais e Sociais.
Reforçada a Capacidade da Linha Fala Criança na coleta e análise de dados com base nas informações recebidas por meio tecnológico no âmbito SRQ.
Bens e Serviços com Terceiro
Para a materialização deste pilar foi identificada a necessidade de reforço da capacidade técnica e operacional através da aquisição de um UPS -APC de 3000W, desenvolvimento do Sistema de Agregação de dados do SRQ; Integração do Sistema de Voz E1, aquisição de 8 headsets para os centros de chamadas e higienização do escritório contra a COVID 19. Entre bens e consumíveis de escritório foram adquiridos (04) quatro laptops para o registo de chamadas, uma mesa com seis cabines telefónicas e igual número de cadeiras do escritório, contribuição nos custos de renda, luz, água internet e outros consumíveis do escritório.
Monitoria e Avaliação
De acordo com o Plano de Actividades acordado entre a Linha Fala Criança – LFC e o Instituto Nacional da Juventude – INJ, as actividades eram circunscritas a (02) dois principais pilares:
1. Gestão e Funcionamento Eficaz do SRQ;
2. Capacidade da LFC na colecta e Análise de Informação.
Feita a monitoria & Avaliação do plano constatou-se que mais de 98% das actividades planificadas foram executadas na plenitude, tendo sido apenas uma actividade a de encontros para divulgação de dados, executado parcialmente.
Panorama de Dados
Descrição Geral
A recolha e registo de dados são feitos em grande escala através de chamadas telefónicas “116”, complementadas por outras fontes tais como denúncias através de caixas de preocupações, denúncias durante as sessões de treinamento de Mentoras e outros, resposta a solicitações dos parceiros. Para o período em alusão 99,3% das denúncias foram feitas através do telefone “116”, 0.7% durante as sessões de treinamentos e através de respostas as solicitações dos parceiros.
A figura faz referência de 94,232 chamadas com intervenção que resultaram em 4,667 Queixas e reclamações sobre “Eu Sou Capaz” e “Emprega” e 3,593 casos de abuso e violência contra crianças, adolescentes e jovens, com 4,178 vítimas2 envolvidas, do universo de 166,751 chamadas gerais.
Perfil dos Benificiários do Eu Sou Capaz e Emprega
Descrição do perfil dos beneficiários
A figura (1.2) mostra a desagregação dos beneficiários do “Eu Sou Capaz” e “Emprega” registadas de acordo com o sexo, constatando-se que (3,685), 79% dos beneficiários são indivíduos do sexo feminino e (976) 21 % são do sexo masculino. As faixas etárias dos 21 à 25 e dos 25 à 35 anos de idade para indivíduos do sexo feminino são os que mais número de queixas/ reclamações apresentaram sobretudo ligados a candidatura do “Emprega”, enquanto para indivíduos do sexo feminino dos 10 aos 15 anos verifica-se aumento de número de queixas/reclamações, na maioria das vezes relacionados com o “Eu Sou Capaz, com tendência de redução a partir dos 16 anos de idade de acordo com a figura (1.3). 53,998 Utentes que contactaram a LFC no período em análise que correspondem a cerca de (57%), foram indivíduos do sexo feminino e 40,234 equivalente a (43%) foram indivíduos do sexo masculino. Desagregando-os por sexo e idade a tabela (1.1) sugere que 53,590 chamadas foram feitas por crianças e adolescentes repartidas em 31,616 crianças do sexo masculino e 21,987 do sexo feminino e 40,560 chamadas foram efectuados por indivíduos com idade entre os 18 aos 35 anos e mais de 35 anos, repartidos em 22,356 efectuados por utentes do sexo masculino, 18,224 utentes do sexo feminino.
Descrição extensiva das chamadas sobre reclamações/queixas
Os dados colectados e designados como Reclamações/Queixas, são organizados em duas categorias:
Categoria de chamadas sobre Eu Sou Capaz (insuficiência de uniforme, insuficiência de bicicletas, uniforme com necessidade de ajuste de tamanho, indícios de corrupção na distribuição de uniforme, outras questões sobre uniforme, higiene menstrual, outras informações sobre bicicletas, programa de mentoria e facilitadores) e Categoria de chamadas sobre Emprega (Agora Emprega, Meu Kit Meu Emprego, Planos de negócios, outras informações sobre Emprega).
Os dados da tabela (1.2) estão catalogados de acordo o tipo de reclamação e sexo do beneficiário em cada reclamação apresentada. Nesta desagregação constatou-se que as reclamações sobre Eu Sou Capaz registaram o maior número de solicitações de informação e/ou reclamações.
Tabela 1.2: Desagregação das sub – categorias sexo dos beneficiários
De acordo com a tabela (1.2), o maior número de solicitações foi para as Outras informações sobre uniforme e bicicletas (38%), na maioria dessas solicitações foram feitas pelos pais e encarregados de educação, professores e alguns Directores das Escolas com intuito de saber quando é que uma determinada escola poderia receber o uniforme e/ou bicicletas. Figuram ainda na lista das maiores solicitações sobre “Eu Sou Capaz”, as reclamações sobre tamanho de uniforme (17%) e insuficiência de uniforme (12%). No ranking das maiores solicitações do “Emprega” o destaque para (11%) de perguntas sobre candidaturas, (7%) de Outras perguntas sobre o Emprega e (4%) de perguntas sobre planos de negócios
Gestão e Seguimento das Queixas
No que se refere a gestão e seguimento de casos, a LFC efectuou a gestão e seguimento de 3,865 solicitações cerca de 83% das reclamações registadas das quais 1,687 equivalente a (36%) foram encaminhadas aos pontos Focais e/ou direcionados as plataformas oficiais da SEJE. Das solicitações referenciados, 1,362 (29%) foram assistidas e 1,055 (23%) encerradas na plenitude, prevalecendo 802 solicitações ainda em seguimento (casos Abertos).
“Uma em cada vinte chamadas registadas estão relacionadas com reclamações/Queixas sobre os Programas “Eu Sou Capaz e Emprega” e uma em cada 2 Reclamações/Queixas está relacionada com Uniforme”
Implementação do Sistema de Resolução de Queixas
Salvaguardas Ambientais e Sociais
No âmbito de Salvaguardas Ambientais e Sociais (SAS),” sob directriz do (SRQ), de acordo com a figura (2.1), a LFC registou das 7 províncias com implantação do Programa “Eu Sou Capaz” 3,593 casos com 3,688 vítimas envolvidas, sendo os casos de Uniões Prematuras (28%), Acesso a Educação (25%), Violação sexual (19%) e Maus-tratos (7%), os que mais denúncia assinalaram. No referente a dados de outras fontes, 44 casos foram colectados durante as sessões de treinamento de mentoras com as seguintes classificações (14- União Prematura, 9- Pensão de alimentos, 12- Violação sexual, 5- de acesso a Educação e 4 – de violência física).
Tabela 1.2: Desagregação das sub – categorias sexo dos beneficiários
Ainda de acordo a tabela (2.1), para além da desagregação dos casos por tipologia, a mesma faz referência ao número de vitimas envolvidas por cada caso, constatando se desta forma que 74% das vitimas são do sexo feminino e 27% do sexo masculino. Repartindo as vítimas por idade e sexo, a figura (2.2), sugere maior prevalência de violências nas vítimas com idades compreendidas entre 10 à 17 anos de idade, ainda que nas vítimas dos 15 aos 17anos a tendência seja decrescente para ambos os sexos.
Descrição perfil dos perpetradores
O perfil dos perpetradores foi caracterizado maioritariamente por indivíduos do sexo masculino (84%), cujo relação com a vítima é de pai, tio, ou sem existência de relação entre as partes conforme ilustrado pela f igura (2.3). Circunstância importante é que em relação ao facto do pai ser indicado como o principal perpetrador em muitas situações não revela que este seja o indecente como sugerido pela figura (2.3) mas porque na ausência de algum bem na casa, ou em caso da criança estar desprovida de algum material escolar (mochila, caderno, recursos para pagar as provas na escola), entre outras situações, o pai é apontado pelos denunciantes como responsável por essa ausência (perpetrador), contudo em alguns casos o pai também é apontado pelos denunciantes como um dos principais responsáveis pela ausência de pagamento de pensão de alimentos e também um dos principais responsáveis que incentivam as uniões prematuras. Do lado feminino foram registadas como perpetradoras 14% das mulheres na sua maioria mãe, tia e também sem relacção entre as partes. Em relacção a designação tio(a), nem sempre significa o real o grau de parentesco entre a vítima e o(a) perpetrador(a), trata-se de uma designação adoptada culturalmente como sinónimo de respeito pelos mais velhos(as). Levando em consideração o factor local de ocorrência das várias formas de desrespeito aos direitos da criança, as evidências sugerem a incidência destes casos no seio familiar, ou seja, grande parte dos casos ocorreram na casa vítima, espaço onde se espera maior segurança para as crianças.
Gestão e Seguimento de casos
Durante este período foram encaminhados cerca de 70% dos casos do universo de 3, 688 casos registados. 71% dos casos Referenciados foram encerrados na íntegra, prevalecendo 847 cerca de 23% dos casos abertos (ainda em seguimento). A tabela (2.4), faz referência das entidades que mais casos foram referenciados, sendo o sector da Polícia através dos GAFMVV foi o que mais recebeu casos da LFC e na sequência foi também a entidade que mais casos assistiram, culminando desta forma com o seu encerramento.